Temas integradores em humanidades: saberes relevantes na formação de professores

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Temas Integradores

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APRESENTAÇÃO

Por que um Colégio com 183 anos de tradição na Educação Básica, um ícone no cenário educacional do país, criou a sua graduação no ano de 2020?
A lei de criação dos Institutos Federais trouxe, como um dos seus objetivos, o dever dessas instituições de oferecer cursos de licenciatura, nas áreas por eles abrangidas. Não obstante, não interessava ao Colégio Pedro II oferecer uma graduação semelhante às demais. Por este motivo que, quando um grupo de professores do próprio Colégio apresentou à Reitoria a proposta das Licenciaturas Integradas, um projeto totalmente diferente dos demais cursos, recebeu, de imediato, o aval para que continuassem no caminho idealizado.
Foi uma gestação difícil. Os proponentes, de diversas disciplinas, trabalharam de forma autônoma, e se reuniram para se apropriarem da legislação pertinente, selecionarem os conteúdos a serem ministrados, verificarem os objetivos do curso, carga horária, forma de avaliação e de ingresso, escolha do campus, seleção dos docentes, aprovação dos cursos nos Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Conepe) e no Conselho Superior (Consup), dentre outros aspectos pertinentes à criação de um curso superior. Todas essas eram etapas necessárias para a criação dos cursos de formação de professores no Colégio Pedro II.
Após três anos de intenso trabalho, nasceram, em março de 2020, as Licenciaturas Integradas em Humanidades do Colégio Pedro II. Na semana seguinte, porém, a pandemia nos obrigou a suspender as atividades presenciais. Os graduandos ainda estavam em fase de adaptação e nem todos os docentes tinham conseguido se apresentar às suas turmas. Não havia sido criado, portanto, laços entre os colegas ou mesmo com a instituição. Um obstáculo gigantesco se colocou logo no início da jornada: os alunos poderiam se dispersar, viriam os abandonos, os trancamentos de matrícula e a evasão escolar.
Para nossa surpresa e felicidade, não foi isso o que aconteceu. Os coordenadores dos cursos e os professores criaram imediatamente estratégias para que, mesmo de forma remota, os estudantes estabelecessem laços de pertencimento com o curso escolhido e com o Colégio Pedro II. Uma dessas estratégias foi justamente a que originou a presente obra. Ao longo de várias semanas, os Coordenadores dos cursos, os professores e convidados de outras instituições abordaram, dentro dos Seminários Temáticos Online, temas atuais e relevantes. Tive o prazer de assistir a vários, e pude constatar a qualidade das palestras e a participação dos alunos dos diversos cursos. Eles tiveram a oportunidade de conhecer seus professores, fazerem perguntas e ouvirem as respostas dos palestrantes.
Convido-os, então, queridos leitores, a uma apreciação saborosa e instigadora do que foi esta série de palestras. Elas intentaram tirar os graduandos da sua zona de conforto, levando-os a questionamentos, a reverem seus (pré)conceitos, suas certezas e suas ideias. Uma amostra da formação crítica que se espera do egresso do Colégio Pedro II.
Em suas páginas, encontrarão, de maneira mais detalhada, a formação dos cursos integrados de Geografia, História, Filosofia e Ciências Sociais, que permanecerão com suas essências, mas mostrarão seus entrelaces, no sentido de formar um professor “inteiro”, com uma visão crítica de mundo muito além do conhecimento apenas da sua disciplina.
Nesta viagem literária, passamos pelo conceito de decolonização, luta de classes, questões étnico-raciais, educação indígena, periferia e arte, violência policial, ensino remoto e pandemia. Para muito além da mera abordagem normativa, os temas são tratados como o alicerce necessário para que o futuro docente possa criar suas propostas e estratégias, trazendo, inclusive, exemplos de atividades pedagógicas.
O livro nos cita o que há de melhor de Paulo Freire, Sankofa, Florestan Fernandes, Carolina Maria de Jesus, Lélia Gonzalez, Davi Kopenawa, Acácia Kuenzer, Antonio Gramsci, dentre outros, nos instigando à pesquisa, para melhor conhecermos as suas obras.
O tema de decolonização é tratado de uma forma bem contundente, para mostrar ao aprendiz a postura ética e crítica que dele se espera, pois o colonialismo não se perdeu no tempo, resistindo e evoluindo na estrutura da sociedade. O estudo mostra que ele sobrevive, até hoje, nas mais diversas formas, cabendo ao professor levar, ao seu alunado, o questionamento e a superação deste modelo.
O racismo e a homofobia são temas inafastáveis na sociedade atual, pois eles estão no nosso dia a dia. Se são vícios estruturais, refletir sobre tais questões, mormente no ambiente escolar, torna-se crucial para sua superação, sob pena de o ambiente escolar se tornar, conscientemente ou não, um mecanismo de manutenção do racismo, através de palavras ou indicações de leitura que não tratam adequadamente um tema tão relevante.
Por outro lado, invisibilizadas, principalmente em nosso estado, as questões indígenas não podem seguir apagadas. Resgatar essa temática é resgatar histórias, conhecimentos e formas de viver e de se relacionar com a natureza indispensáveis para pensar o desenvolvimento sustentável e ético. Abordar questões a partir deste olhar torna a escola mais plural e crítica e, por isso, mais capaz de formar indivíduos pensantes e transformadores.
A periferia e a arte também não foram esquecidas. Principalmente por termos a graduação em um campus da periferia, é importante levar aos graduandos o conceito de arte e o lugar que ela ocupa no mundo de hoje. Se temos os grandes mestres da pintura, temos que reverenciar também as artes marginalizadas, como os grafiteiros, pois dessa forma estamos valorizando a cultura que cada indivíduo traz consigo.
Em “Geografia da Morte”, percebemos que a violência é um braço ativo de nosso Estado e a realidade palpável de boa parte da população, principalmente em nossa região. O texto traz um retrato de uma cidade manchada pela violência policial, que nem a pandemia conseguiu fazer retroceder. Os dados são mostrados de uma forma crua e devem servir como embasamento para ações educativas e como justificativas para enfrentar índices de retenção e de evasão escolar. Interessante perceber como esse tema também não passa distante de uma disciplina de Humanidades. Formar um educador não apenas consciente da violência estatal, mas empático às vítimas desta violência e sensível à complexidade dessa realidade, muito além de maniqueísmos simplistas, é o papel do Colégio Pedro II.
A autonomia do trabalho docente é o desejo máximo do profissional. O professor deve “sair de si mesmo” para dar autonomia a seu aluno. Como formar um professor para este tipo de trabalho é mostrado em seus últimos capítulos, nos quais se explicita que o processo educativo não pode se dar de forma precária ou aligeirada, traçando, ainda, os perigos da presença de empresários no cenário educacional, visto que o objetivo destes passa longe de priorizarem o oferecimento de uma educação de qualidade. A preocupação com o ensino remoto também se apresenta como uma questão, já que tira o educando de dentro da escola, onde a socialização e o contato com professores, demais alunos e servidores, se caracterizando, segundo o autor, “como uma versão piorada do ensino à distância”. Retrata, nesse particular, o receio do autor de se aproveitarem deste momento de fragilidade educacional, devido à pandemia, para a mercantilização da educação, com uma cobertura de modernização do ensino, tirando o protagonismo do professor/aluno e dando-lhe uma tutoria/tutelado.
O livro não é contra novas técnicas e tecnologias na educação, desde que elas estejam a serviço desta, e não o contrário. Ademais, temos que estar atentos para o fato de se todos os educandos estão em igualdade de condições de acompanharem a tecnologia ofertada, pois senão teremos uma educação para poucos, e os mais vulneráveis mais uma vez ficarão à margem, olhando o mundo da tela de um celular, nem sempre da melhor qualidade, sem capacidade de manifestação, ação ou voz.
A leitura completa nos leva à compreensão de que queremos formar um docente capaz de compreender qual é o seu papel dentro da estrutura da sociedade que temos, e a sua importância na formação de outras pessoas. Esse é o nosso diferencial: uma licenciatura que agregue condições para que o graduando consiga ver a plenitude do que dele se espera, oferecendo a ele uma aliança perfeita entre a teoria e a prática, um ensino inter-trans-disciplinar, formando um professor inquiridor, um pesquisador, sem fórmulas a serem seguidas, um profissional autônomo, ciente dos seus princípios éticos, que considere a educação como a forma de crescimento integral de um indivíduo, pensando em si, em seus alunos e na sociedade.
Os artigos nos levam a uma grande reflexão do quanto precisaremos caminhar para cumprir a nossa missão de formar educadores autônomos e comprometidos, mas, pelo que estamos vendo até agora, estão os coordenadores e professores dos cursos em tela no caminho certo.
Desejo a todos uma boa leitura!

Prof. Eliana Myra de Moraes Soares
Pró-Reitora de Ensino do Colégio Pedro II.

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